Marli Martins Mercês Beraldo, 52 anos, casada, três filhos e um neto, é natural de Belo Horizonte. Nasceu no Morro do Papagaio e desde os 07 anos foi viver na cidade de Sarzedo. Tendo por inspiração sua mãe, catadora de materiais recicláveis, Marli desde muito cedo se engajou nos movimentos sociais: “Minha casa sempre foi um palco de cultura e de acolhimento, minha mãe sempre acolheu as pessoas, eu cresci nesse contexto!”.
Durante sua infância, o complemento financeiro da família advinha da catação de materiais recicláveis. Ao dar início a sua caminhada política e de luta, teve a atenção chamada por sua mãe para que se lembrasse dos catadores, ou seja, de suas origens. Marli sempre atuou na defesa dos direitos sociais. Hoje ela é representante do Movimento Nacional de Catadoras e Catadores (MNCR), fundadora e atual presidente da Associação de Catadores de Materiais Recicláveis de Sarzedo (ACAMARES).
“Ser catadora de material reciclável da ACAMARES, pra mim, foi uma missão.”
Fundada em 23 de outubro de 2013, a ACAMARES é um projeto de coleta de materiais recicláveis, gestado por mulheres, em sua maioria negras, que atua nos municípios de Sarzedo e Mário Campos. Em seu aniversário de uma década (de legalidade, pois a luta para sua efetivação se aproxima dos vinte anos), a ACAMARES comemora uma conquista alcançada esse ano: a contratação de catadoras e catadores que através de um termo de fomento, recebem por prestação de serviço por tonelada coletada de material reciclável na cidade dentro do Programa Municipal de Coleta Seletiva Sarzedo Recicla Mais. É um marco histórico na região!
Composta atualmente por 15 catadoras e catadores a ACAMARES se desenvolve através de três frentes de atuação: Reciclagem Popular, Costura Criativa por meio da técnica de reaproveitamento de tecidos e consumo consciente e a Agroecologia, incentivando a geração de renda, a agricultura urbana e práticas do bem viver e a garantia da soberania alimentar.
Há também o espaço chamado “(Re)ciclo Criativo”, um espaço permanente de economia solidária que nasceu do reaproveitamento de materiais recicláveis reutilizados nas produções da Costura Criativa e da Agroecologia.
Nesses anos de caminhada, encontraram importantes parceiros que tem os acompanhado e conectado com uma rede de apoio que tem gerado muitas conexões e solidariedade.
Marli destaca a importância do financiamento, relatou a realidade de várias entidades do interior atualmente: estão fechando por falta de investimento. É preciso entender que a coleta e o tratamento de materiais recicláveis é um empreendimento, gera renda, produz recursos e é essencial para uma existência saudável da humanidade. A crise climática é uma realidade urgente que já atingiu diretamente todas as pessoas, e não podemos mais ficar apáticos quanto a isso, nem enquanto cidadãos e nem enquanto Estado.
As atividades que a ACAMARES vem desenvolvendo ao longo dos anos, estão alinhadas com os objetivos do desenvolvimento sustentável da agenda 2030, sobretudo a ODS 11 – Cidades e Comunidades Sustentáveis, mas sabemos que mais atores, sobretudo as instituições de Estado e as empresas privadas precisam assumir as suas responsabilidades, os movimentos sociais sozinhos não dão conta dessa agenda.
Apesar dos obstáculos, ela se sente esperançosa, acredita na proposta do governo Lula. É muito importante lembrarmos a simbologia de termos a faixa presidencial sendo entregue pelas mãos de uma catadora. Não só a visibilidade se faz importante, mas também o recurso para que catadoras e catadores continuem existindo e trabalhando.
Na posição de mulher preta, Marli relata que a maior dificuldade que ela enfrenta são as violências estruturantes que nos impedem de acessar direitos, seja pelo recorte racial e de gênero, seja pela estigmatização do trabalho da catação. Violências que nos privam de direitos fundamentais, de respeito, são dores na alma.
“A gente é mão de obra barata.
Esse é o povo que mais produz.
A conta não fecha”.
Ela chama atenção para as injustiças do sistema, enquanto as grandes empresas lucram incessantemente, quem produz toda a riqueza mal tem acesso a um salário mínimo. Entretanto estamos em um momento de esperançar: as mudanças estruturais sempre levam tempo, mas elas são possíveis de serem feitas e estamos no caminho para alcançá-las.
“A força da mulher catadora sustenta o planeta!”
Entrevista e Texto: Maria Regina Duarte Reis.